O
artigo discute a forma de um argumento em favor da ressurreição de Jesus do
modo como o Cristianismo acredita que esta ocorreu, o qual, se bem-sucedido,
seria um forte indício histórico da existência de Deus. O artigo sustenta que
Deus teve boas razões para se encarnar por certos propósitos e que, se assim
ele o fez, ele viveria um certo tipo de vida como um ser humano, que seria
culminada por um supermilagre como sua ressurreição.
Se encontrarmos um e apenas um ser humano
em toda a história sobre o qual haja uma quantidade modesta de indícios do tipo
que se esperaria se ele viveu aquele tipo de vida e uma modesta quantidade de
indícios do tipo a ser esperado se aquela vida fosse culminada por um
supermilagre como a ressurreição, isso é um indício bem forte de que aquele ser
humano era Deus encarnado. Assim, aqueles indícios aumentariam significativamente
a probabilidade de que Deus existe.
Palavras-chave: ressurreição, Jesus, probabilidade, encarnação.
A
discussão nesta conferência de um argumento para a existência de Deus difere
das discussões dos argumentos apresentados nas duas palestras anteriores em
dois aspectos. Em primeiro lugar, ela discute apenas a forma de um
argumento a partir de um certo indício histórico. O indício histórico é
complicado e tem sido discutido extensamente por inúmeros especialistas em Novo Testamento. Eu
mesmo fiz algumas contribuições pormenorizadas para essa literatura num livro
recente(1).
O que estou preocupado em mostrar aqui é o
tipo de indício histórico que precisamos e o quão forte ele tem de ser para que
alcancemos nossa conclusão. Em segundo lugar, a conclusão que estou buscando
estabelecer não é apenas de que Deus existe, mas que ele se tornou encarnado em Jesus Cristo, que
ressurgiu dos mortos fisicamente na manhã do primeiro dia de Páscoa.
Isso obviamente acarreta que Deus existe!
Mas se a prática de qualquer religião deve ser racional, as crenças que devem
ser racionais não são apenas as crenças de que existe um Deus, mas crenças mais
pormenorizadas – incluindo, no caso da religião cristã, aquela que eu acabei de
mencionar. Precisamos de crenças acerca de como Deus interage conosco para
nossa religião se tornar relevante. E para essas crenças serem racionais, deve
haver bons argumentos probabilísticos que as mostrem como tais.
Assim, vamos considerar como poderíamos
mostrar que Jesus (provavelmente) ressurgiu dos mortos depois de sua morte por
crucifixão 36 horas antes. Uma conclusão acerca de quem Jesus era será vista na
seqüência.
Na avaliação de qualquer hipótese
histórica, devemos levar em conta três tipos de indícios. O primeiro tipo é o
mais óbvio – o relato de testemunhas acerca dos dados físicos causados pelo que
aconteceu no tempo e lugar em
questão. Se é sugerido que John roubou um certo cofre, então
nossa evidência histórica óbvia é o que as testemunhas disseram (sobre quem
estava perto do cofre no momento em questão e onde John estava naquela hora) e
dados físicos tais como impressões digitais no cofre, dinheiro achado na
garagem de John, etc. Chamarei tais indícios de indícios históricos
posteriores.
Na medida em que a hipótese é simples e os
indícios históricos posteriores são tais que você esperaria encontrá-los se a
hipótese em questão for verdadeira, mas não de outro modo, isso é prova de que
a hipótese é verdadeira. Por exemplo, se John roubou o cofre, você esperaria
encontrar suas impressões digitais nele, mas não esperaria encontrá-las se ele
não o tivesse roubado. Na falta de indícios para uma hipótese da
inconfiabilidade das testemunhas, se John roubou o cofre, você esperaria que
qualquer pessoa que viu John naquela hora, ou que estivesse perto do cofre
naquela hora, dissesse que viu John ali. Mas não esperaria que ela o dissesse
se John não estivesse ali.
Enfatizo aqui, como nas conferências
anteriores e em outro ponto nesta conferência, a importância crucial da
simplicidade ao avaliar a verdade de uma teoria. Há sempre um número infinito
de teorias possíveis na ciência, história ou qualquer outra esfera de
investigação que são tais que, se elas fossem verdadeiras, você esperaria
encontrar o indício encontrado.
As impressões digitais de John no cofre, o
testemunho de George acerca da presença de John na cena do roubo na hora de sua
ocorrência e o fato de John ter um monte de dinheiro escondido em sua garagem
poderiam ser facilmente explicados por Harry ter impresso as impressões digitais
ali por brincadeira, George dizer uma mentira porque ele não gosta de John e
Jim ter colocado o resultado de outro roubo na garagem de John. Mas, na falta
de indícios a mais, a teoria de que John cometeu o crime é a mais provavelmente
verdadeira, pois é a mais simples ao postular que uma pessoa (John), ao fazer
algo (roubar o cofre), causou, de diferentes maneiras, os três indícios
elencados.
A menos que a teoria mais simples sobre os
dados seja a mais provavelmente verdadeira, nenhuma teoria científica teria
qualquer justificação, pois é muito fácil inventar um número infinito de
teorias que são tais que tornam provável a ocorrência dos dados, mas que
discordam totalmente entre si em suas predições para o futuro. A menos que haja
algo interno à teoria, que não sua relação com os dados, que a faça
provavelmente verdadeira, devemos abandonar qualquer investigação; e nossas
claras convicções sobre o que é evidência do que indicam que a simplicidade é
aquela característica interna que tomamos como evidência da verdade.
Assim como os indícios históricos
posteriores, precisamos levar em conta indícios gerais de fundo acerca do quão
provável a hipótese é verdadeira, independentemente dos indícios históricos
pormenorizados. Em meu humilde exemplo, este indício será evidência do
comportamento passado de John e o comportamento passado de outros sujeitos que
poderiam, por exemplo, sustentar fortemente (como sua explicação mais simples)
uma teoria de que John não é o tipo de pessoa que roubaria um cofre, enquanto George
é exatamente este tipo de pessoa. Nesse caso, ainda que os indícios históricos
posteriores fossem exatamente os que nós esperaríamos se John tivesse roubado o
cofre, mas não os que nós poderíamos esperar se George tivesse roubado o cofre,
nós poderíamos corretamente concluir que George é provavelmente o culpado.
Neste
exemplo, os indícios de fundo eram bastante limitados – o comportamento passado
de John ou George. Mas a influência conjunta dos indícios de fundo e dos
indícios históricos posteriores opera onde os indícios de fundo são muito mais
gerais. Suponha que o astrônomo observe em seu telescópio um certo padrão de
pontos de brilho que é exatamente o que você encontraria se esses pontos fossem
os estilhaços de uma explosão de supernova. É correto interpretá-los assim, se
a teoria física mais sustentada por todos os indícios disponíveis ao físico –
ou seja, os indícios gerais de fundo – permitem dizer que supernovas podem
explodir.
Mas se sua teoria física
diz que supernovas não podem explodir, então, a hipótese de que uma explodiu
nesta ocasião vai precisar de uma enorme quantidade de indícios históricos
pormenorizados (eles próprios altamente improváveis em vista de quaisquer
hipóteses de simplicidade igual), diferentes da hipótese de que foram causados
por uma explosão de supernova, antes que possamos encará-los como prováveis – e
se de fato os encaramos como tais, teremos que encarar como improvável toda a
teoria física que a exclui, dado nosso novo indício histórico pormenorizado.
O indício geral de fundo
pode indicar não apenas que a hipótese postulada é ou não é provavelmente
verdadeira, mas que é provavelmente verdadeira apenas sob certas condições –
por exemplo, que John provavelmente rouba cofres quando, e apenas quando, está
financeiramente quebrado, ou que supernovas provavelmente explodem quando, e
apenas quando, elas atingem uma certa idade. Nesse caso, um outro tipo de
indício histórico vai entrar na equação, indícios mostrando que aquelas
condições condutoras estavam ou não estavam presentes. Isso, de novo, será
forte na medida em que isso é o que você esperaria encontrar se aquelas
condições estivessem presentes e não de outro modo (e na medida em que a
suposição destas condições for simples). Chamarei um tal indício de indício histórico
prévio.
Quando estamos lidando com
uma hipótese h
que não seria improvável demais segundo uma visão de mundo t, mas que seria
imensamente provável segundo uma visão de mundo rival, o indício geral de fundo
será formado de todo o indício que for relevante para a probabilidade das
diferentes visões de mundo; e à medida que ele sustenta mais fortemente a visão
de mundo t que
faz h não tão
improvável, precisamos de menos indícios históricos pormenorizados para a
afirmação de que h
é verdadeira, ou seja, provável em
geral. A hipótese de que Jesus ressurgiu dos mortos é
exatamente desse tipo.
Pois, se Deus não existe,
o determinante último do que acontece no mundo são as leis da natureza, e se
alguém morto há 36 horas voltasse a viver, seria (com imensa probabilidade) uma
clara violação daquelas leis, e, portanto, seria impossível. Isso diz respeito
à razão que Hume deu – de que todos os indícios de que alguma regularidade
operou em muitas outras ocasiões passadas conhecidas é prova de que isso é uma lei
da natureza e, assim, que operou naquela ocasião também e que Jesus não
ressurgiu.
Mas, se um Deus do tipo
tradicional existe, as leis da natureza operam apenas porque Ele as faz operar
e ele tem o poder de as suspender por um momento ou para sempre. Assim, se
Jesus ressurgiu dos mortos, Deus o ressuscitou. Desse modo, tratarei a hipótese
de que Jesus ressurgiu como equivalente à hipótese de que Deus ressuscitou
Jesus. Mas se existe um Deus com o poder de ressuscitar Jesus, ele apenas o
fará na medida em que ele tiver razão para fazê-lo; e se Ele não a tiver, essa
ressurreição não deve ser esperada.
Portanto, para determinar
se Jesus ressurgiu dos mortos, não é o bastante investigar se o que eu chamei
de indício histórico posterior (o que São Paulo escreveu, que o texto original
do Evangelho de Marcos terminou em 16.8, ou o que foi escrito no texto original
das Antigüidades
de Josefo) é o tipo de indício a ser esperado se Jesus ressurgiu, mas não o
contrário.
Pode-se também investigar
se os indícios gerais de fundo sustentam a visão de mundo de que existe um Deus
de um tipo capaz e propenso a intervir na história humana dessa maneira, nesse
tipo de situação, ou se não existe um tal Deus. Devemos também investigar os
indícios históricos prévios, ou seja, se a natureza e circunstâncias da vida de
Jesus eram tais que, se Deus existe, Ele seria propenso a ressuscitar esta pessoa dos
mortos.
Na medida em que nossos
indícios gerais de fundo e históricos prévios sustentam a visão de que existe
um Deus que seria propenso a ressuscitar Jesus dos mortos, precisaremos de
muito menos indícios históricos minuciosos para tornar provável em geral que
Jesus ressurgiu dos mortos, dada a totalidade dos nossos indícios.
Por outro lado, na medida
em que nossos indícios prévios (de fundo ou históricos) sustentam uma visão de
mundo rival de que Deus (do tipo tradicional) não existe, ou que, se existe um
tal Deus, Ele não tem razão para intervir na história humana desse modo, ou que
mesmo se Deus de fato tem tais razões, Jesus não era o tipo de pessoa que ele
teria trazido à vida novamente, precisaríamos de uma imensa quantidade de
indícios históricos posteriores para que a totalidade de nossos indícios
tornasse provável que Jesus ressurgiu. Estudiosos do Novo Testamento, tanto
aqueles que acreditam como aqueles que não acreditam que a ressurreição
aconteceu, fazem afirmações como: “Eu [diferentemente de meus oponentes] vou
chegar à minha conclusão apenas com base nos indícios históricos”, (e com isso
eles querem dizer o que eu chamei indícios históricos posteriores) e nada mais.
Se fosse possível fazer
uma tal coisa, seria altamente irracional, pois significaria levar em conta
apenas parte dos indícios. Mas não é nem mesmo possível fazê-lo, pois, a fim de
se chegar a uma conclusão acerca de se seus indícios tornam provável que a
ressurreição ocorreu ou não, você precisa de uma visão acerca de quantos
indícios históricos posteriores são requeridos para mostrá-lo; e você não pode
ter isso sem ter uma visão acerca de quão provável seja que um evento ocorra em
todo caso – e isso envolve tomar uma perspectiva acerca de se Deus existe e o
que é provável que Ele faça.
O que os estudiosos do
Novo Testamento estão prontos a negar que fazem, eles na verdade fazem
implicitamente, pois ao chegar a uma conclusão acerca da ressurreição, eles
devem assumir uma perspectiva acerca de quão fortes os indícios históricos
posteriores precisam ser.Argumentei nas duas conferências anteriores em favor
da visão de que a existência de um universo, sua quase total conformidade às
leis naturais, o fato daquelas leis serem tais que levam à evolução de seres
humanos e de que estes têm almas (uma vida mental contínua, cuja continuidade é
separada da continuidade de sua vida física) são indícios que dão probabilidade
significativa à existência de Deus.
Não tive tempo de discutir
outros indícios publicamente disponíveis e muito gerais em favor da existência
de Deus, incluindo – crucialmente – o indício muito difundido da experiência
religiosa. Nem tive tempo de discutir os indícios contra a existência de Deus,
especialmente a evidência da dor e do sofrimento. Não podemos repassar a base
anterior de novo, nem discutir esses tipos cruciais adicionais de indícios.
Assim, vou simplesmente pedir-lhes que no momento suponham que todos esses
indícios da teologia natural (e da ateologia natural) tornam tão provável
quanto não que Deus existe; que a probabilidade de que Deus existe, dados todos
esses indícios, é de 0,5.
Veremos em dado momento as
conseqüências de enfraquecer ou fortalecer esta suposição. Se Deus existisse,
então Ele claramente poderia, se assim escolhesse, ressuscitar Jesus dos
mortos. Assim, na medida em que, em virtude de sua bondade, Ele tem razão para
fazê-lo, é provável que Ele o faça. Deus muito raramente ressuscita os mortos
(nos seus corpos originais, enquanto outros na Terra continuam suas vidas
normais). J
esus precisaria, portanto,
ser um tipo bem especial de pessoa para que Deus tivesse razão para
ressuscitá-lo. Podem haver várias razões pelas quais Deus escolheria
ressuscitar Jesus, mas considerarei aqui apenas as razões que Deus teria se
Jesus fosse Deus Encarnado – pois, como veremos posteriormente, dado o tipo de
vida que Jesus viveu, Ele apenas poderia tê-lo ressuscitado se ele fosse Deus
Encarnado. Ou seja, argumentarei que em virtude da bondade de Deus, Ele tinha
razão de se encarnar como um ser humano e viver um certo tipo de vida e que, se
ele o fez, Deus teve razão de ressuscitar aquele ser humano dos mortos.
Os teólogos sempre
afirmaram que a principal razão pela qual Deus escolheria encarnar-se seria
fazer uma expiação pelos pecados humanos (Quadro "Eis o homem",
Pilatos ao apresentar Jesus aos judeus, de Antonio Ciseri). E
les apresentaram suas
várias teorias quanto ao motivo pelo qual os humanos precisam da expiação, como
eles são incapazes de fazê-la por si mesmos e como apenas Deus poderia
provê-la, tornando-se Encarnado, sofrendo e morrendo, e como, por esse modo,
Deus poderia tornar a expiação disponível a todos os que aceitaram a ação de
Deus em seu nome: a teoria de que a morte de Deus Encarnado pagaria um resgate
para o demônio, ou a teoria de que seria uma punição penosamente sofrida em
nosso nome, ou a teoria de que seria Deus Encarnado pagando uma compensação
para Deus Pai pelo que nós fizemos de errado, e a teoria de que a vida e morte
de Deus Encarnado constituiriam um sacrifício oferecido a Deus Pai em nome dos
homens.
Deus não tem direito de
mandar ninguém mais para fazer uma tarefa tão formidável (qualquer que seja sua
natureza exata) em seu nome. Ele deve agir por si mesmo. Essas teorias, então,
buscam explicar porque um Deus bom poderia escolher encarnar-se em um modo em que Ele seria morto por
levar uma vida santa.
Enquanto levando essa
vida, Ele precisaria explicar-nos que aquela vida estava sendo levada para nos
redimir de nossos pecados. Assim, a ressurreição consistiria na demonstração de
Deus para nós de que o resgate e a compensação foram pagos e a punição ou o
sacrifício, aceitos. Pois, em todas essas perspectivas, os humanos precisam
aceitar e usar esta vida e morte redentoras. A ressurreição de alguém morto por
36 horas seria, como notei, uma violação das leis da natureza, e isso só
poderia ser feito por aquele que mantém as leis da natureza operativas – Deus.
Trazer à vida alguém morto
por viver um tipo de vida (e sofrer um certo tipo de morte) constituiria,
então, a demonstração de Deus para nós de sua aceitação daquela vida com uma
adequada compensação, sacrifício ou o que quer que seja; seu aval sobre aquela
vida.
A segunda razão pela qual
Deus escolheria encarnar-se é uma razão que valeria mesmo se os humanos não
tivessem pecado. Deus fez humanos sujeitos a dor e sofrimentos de vários tipos
causados por processos naturais. Deus, sendo perfeitamente bom, apenas teria
permitido essa sujeição se isso servisse para um bem maior.
A teodicéia busca explicar
quais são os bens maiores relevantes (2)–
por exemplo, o grande bem de humanos terem uma escolha livre significativa de
suportar ou não, com bravura, seu próprio sofrimento e mostrar compaixão a
outros que sofrem. Nós humanos, às vezes, sujeitamos corretamente nossos
próprios filhos ao sofrimento em virtude de um bem maior (para eles mesmos ou
outros) – por exemplo, fazendo-os comer uma dieta sem graça ou obrigando-os a
fazer algum tipo de exercício para a saúde deles, ou fazendoos freqüentar uma
escola local “difícil” para que tenham boas relações comunitárias.
Sob essas circunstâncias,
julgamos uma boa coisa manifestar solidariedade a nossos filhos pondo-nos de
algum modo na mesma situação – partilhando de sua dieta ou exercício, ou
envolvendo-nos na associação de pais e mestres da escola local. De fato, se
sujeitamos nossos filhos a grandes sofrimentos em vista de bens maiores que
outros, surge um ponto no qual não é apenas bom, mas obrigatório
identificarmo-nos com o sofredor e mostrar-lhe que o estamos fazendo. Um Deus
perfeitamente bom julgaria ser uma boa coisa partilhar a dor e o sofrimento a
que Ele nos sujeita, em vista de bens maiores – encarnando-se.
Viver uma vida santa,
protestando contra a injustiça sob condições difíceis, pode levar à execução.
Deus precisaria nos ter dito ou mostrado que ele é o Deus Encarnado. Nesse
caso, sua ressurreição constituiria o aval de Deus àquele ensinamento e, assim,
mostrar-nos que Deus se identificou com o nosso sofrimento.E, finalmente,
precisamos de melhor informação acerca de como levar boas vidas no futuro e de
encorajamento e ajuda para fazê-lo. Os humanos podem, e até certo ponto nos
séculos antes de Cristo o fizeram, descobrir por si mesmos o que é certo ou
errado. Mas embora as linhas gerais possam ser descobertas, os pormenores não
são fáceis de se encontrar.
Será que aborto e
eutanásia são sempre errados, ou apenas sob certas condições? Será que relações
homossexuais são algumas vezes permissíveis ou nunca?, e etc. Em tudo, nesses
assuntos, os humanos não estão prontos a enfrentar o que indicam suas
consciências. Eles precisam de informação. Certo, isso poderia ser provido por
uma revelação a algum profeta sem necessidade de encarnação. Mas a informação
moral precisa ser preenchida pelo exemplo moral – precisamos ser apresentados a
em que consiste a vida perfeita e que Deus não tem direito de dizer a ninguém
mais para fazê-lo por Ele. Seria bom para essa informação incluir uma mensagem
encorajadora, por exemplo, de que Deus vai nos levar para o céu se confiarmos
nele e atendermos seus mandamentos.
Seria bom se Deus nos
desse alguma ajuda extra para levarmos a vida moral – uma comunidade de
encorajamento, por exemplo. Novamente, Deus, ressuscitando alguém morto por
pregar um certo ensinamento e por viver um certo tipo de vida constitui esse
aval daquele ensinamento.Temos agora três razões pelas quais um Deus bom poderia
escolher se encarnar de modo a sofrer e provavelmente morrer e como ele
precisaria nos mostrar que era ele que tinha feito isso – o que seria alcançado
por um supermilagre como a ressurreição.
No meu ponto de vista,
enquanto é muito provável que, em virtude de sua bondade, Deus pudesse escolher
encarnar-se pela primeira e terceira razões, Ele não tem nenhuma obrigação de
fazê-lo e há outras maneiras (talvez menos satisfatórias) de lidar com
problemas para os quais sua encarnação por esses motivos proveria uma solução.
Mas, na minha opinião, dada a extensão do sofrimento humano, nosso criador tem
uma obrigação de partilhá-lo conosco e, assim, é necessário que ele se encarne
pela segunda razão.
Assim, se Deus de
fato se encarnou em um ser humano (chamê-mo-lo um “profeta”) pela
segunda razão e uma ou ambas as outras razões, então ele precisaria viver um
certo tipo de vida. Para se identificar com nosso sofrimento e nos dar
um exemplo, Deus Encarnado precisa viver uma vida boa em circunstâncias
difíceis, e uma vida boa, mas difícil, terminando em uma execução judicial,
seria certamente isso. Para nos mostrar que Ele é Deus, que foi Deus que fez
isso, Ele precisa nos mostrar que Ele acredita ser Ele mesmo Deus.
Para nos possibilitar usar
sua vida e morte para o pagamento dos nossos pecados, Ele precisa nos dizer que
ele está vivendo sua vida por esse propósito. A fim de tornar plausível que Ele
esteja pregando uma revelação, Ele precisa nos dar um ensinamento moral bom e
profundo acerca de como viver. E para tornar tudo isso disponível a gerações e
culturas diferentes daquela na qual Ele viveu, Ele precisa fundar uma Igreja
para ensinar os homens o que Ele fez e estender a eles sua vida redentora.
Assim, temos razão prévia para esperar uma ressurreição, não de qualquer ser
humano, mas de um homem de quem há indícios de que tenha levado uma vida do
tipo acima.
Quanto mais fortes os
indícios de fundo de que existe um Deus cuja bondade o levaria a se encarnar
pelas razões citadas, e quanto mais fortes os indícios históricos prévios de
que Jesus levou o tipo de vida descrito acima, mais forte a razão que temos
para supor que Deus daria seu aval a esta por um supermilagre como a
ressurreição.Nossos indícios históricos acerca da vida e ensinamentos de Jesus
não são, é claro, em enorme quantidade e requerem uma cuidadosa triagem.
Minha avaliação do balanço
da erudição acerca do Novo Testamento é que os indícios são tais que
esperaríamos que, se Jesus levou uma vida boa e santa, deu-nos um bom e
profundo ensinamento moral, fundou uma Igreja que realmente ensinou que Ele era
Deus Encarnado, que pagou por nossos pecados. É, penso eu, impossível de
entender seu ato de formar uma comunidade de 12 líderes a não ser de modo a
criar um novo Israel, seja para no final torná-la independente ou mesmo para se
fundir novamente com o antigo Israel.
A erudição do Novo
Testamento é, contudo, dividida acerca de se os indícios são tais que se
poderia esperar que se, e apenas se, Jesus proclamou que sua vida e morte
seriam um pagamento pelos pecados; e se, no geral, afirma-se que os indícios
não são tais como se esperaria se Jesus ensinasse sua divindade. Minha posição
é de que os indícios históricos prévios são tais que se pode esperar com
modesta probabilidade (digamos, 1/4) que Jesus ensinou tanto sua expiação
quanto sua divindade. Mas não estou defendendo isso aqui.
Minha tese aqui é de que
quanto mais fortes são os indícios históricos prévios de que a vida e
ensinamentode Jesus eram de um certo tipo, mais razão nós temos para esperar
que Deus o ressuscitou dos mortos.
Apenas à luz dos indícios
gerais de fundo e dos indícios históricos prévios podemos abordar o tipo de
indícios que normalmente apenas estudiosos do Novo Testamento consideram
relevantes – o relato de testemunhas (ou a falta disso) acerca das aparições de
Jesus ressuscitado e o túmulo vazio, o que tenho chamado de indícios históricos
posteriores. A isso acrescento o indício muito negligenciado da celebração
universal pela Igreja primitiva da eucaristia aos domingos.
A última ceia original foi
celebrada em uma quinta-feira. Seria natural repeti-la em uma quinta, ou no
sábado judaico, ou anualmente, no tempo da Páscoa, mas foi celebrada
subseqüentemente em um domingo, o que só pode ser plausivelmente explicado por
uma Igreja que acreditava que o seu principal evento de fundação ocorreu em um
domingo.
Os discípulos fundaram
novas igrejas fora de Jerusalém dentro do primeiro ou segundo ano da Paixão e
da suposta ressurreição. Esse costume universal da celebração do domingo
mostrou que, já em seu primeiro ano, a Igreja acreditava que seu evento de
fundação mais importante tinha acontecido em um domingo, e há apenas um evento
possível assim – a ressurreição. Aqui a questão é: se Jesus ressurgiu, seria
esperado esse tipo e quantidade de testemunhas? Caso a resposta seja sim,
então, é claro, os indícios sustentam a ressurreição.
Preciso agora acrescentar
mais um indício para os indícios históricos prévios. É o de que Jesus levou a
vida que levou quando não havia outro sério pretendente conhecido (antes ou
depois de Jesus) para satisfazer, como Jesus, os requisitos prévios ou
posteriores para ser um Deus Encarnado. Por requisitos prévios quero dizer
viver uma vida boa e santa, dando-nos um ensinamento moral bom e profundo,
mostrando-nos que ele acreditava ser Deus Encarnado, que estava fazendo um
sacrifício para os nossos pecados e fundou uma Igreja que ensinou essas coisas.
Por requisitos posteriores quero dizer sua vida ter culminado em um
supermilagre tal como a ressurreição dos mortos.
Outros fundadores de
grandes religiões viveram, é claro, vidas boas, deram ensinamento moral
profundo e fundaram Igrejas – o Buda, por exemplo. Mas, manifestamente, Buda
não ensinou sua própria divindade e nem o fez Maomé. Manifestamente, nenhum
deles ensinou que suas vidas eram o pagamento por nossos pecados. Houve muitos
messias modernos que disseram ser Deus, mas eles não satisfizeram os outros
requisitos – em particular, suas vidas não foram santas. Nenhuma outra grande
religião afora o Cristianismo afirmou ter sido fundada por um supermilagre para
o qual haja o tipo de testemunho pormenorizado que há para o milagre de
fundação do Cristianismo (mesmo que isso possa parecer inadequado para alguns).
Ao fazer essas observações
acerca de outras religiões, não pretendo rebaixá-las – estou apenas apontando
para o elemento historicamente incontestável de que elas não fazem o tipo de
afirmações (verdadeiras ou falsas) acerca de seus fundadores tal como o
Cristianismo faz acerca do seu. Não é com base nisso que elas buscam sua
legitimidade.A relevância desse fato é que mostra que ou Deus se tornou
encarnado em Jesus pelas razões apresentadas ou que Ele até agora não se
encarnou por essas razões. Nossas razões para esperar uma encarnação não foram
atendidas, no entanto; é claro, pois, em teoria, elas poderiam sempre ser
atendidas em um momento posterior.
Mas a não-existência, até
agora, de qualquer outro candidato plausível para satisfazer ou os requisitos
prévios ou os posteriores mostra que a coincidência dos indícios prévios e
posteriores (mesmo que fracos) em um candidato é um evento extremamente
improvável no curso normal das coisas – ou seja, a menos que Deus tenha causado
isso, seja por intervir na história ou por fazer as leis naturais em condições
iniciais como eram para o único propósito de produzir esse efeito.
No entanto, se Deus iria
encarnar pelas razões que eu considerei e, contudo, ele não se encarnou em
Jesus, causar a existência da quantidade e tipo de indícios de sua encarnação
(inclusive o indício de que ele proclamou que estava se sacrificando por nossos
pecados – o que Deus não deveria permitir que outros fizessem) em Jesus, e
também a quantidade e tipo de indícios que há de sua ressurreição, sem que ele
fosse Deus Encarnado, seria enganador por parte de Deus.
Seria como colocar as
impressões digitais de uma pessoa inocente na cena do crime. Isso um Deus
perfeitamente bom não faria.Tendo delineado em termos qualitativos o tipo de
indícios que precisam ser pesados a fim de se ver se tornam provável que Jesus
ressuscitou dos mortos, demos a isso o rigor quantitativo em termos do cálculo
de probabilidades, particularmente, em termos do Teorema de Bayes, que a essas
alturas já é bastante familiar a vocês. De qualquer modo, vamos recordá-lo
brevemente. Eu expresso nesse teorema usando as letras e, h e k quaisquer proposições;
mas, em nosso caso particular, e
representa os indícios observados (dados), k
representa “indícios de fundo” e h
é a hipótese sob investigação.
Esse teorema estabelece de um modo formal
os fatores que determinam o quanto indícios observacionais sustentam uma
hipótese. P(h/e.k)
pode ser chamada a probabilidade posterior de h, ou seja, sua probabilidade dadas e e k. O teorema propõe que
a hipótese h
se torna provável pelos indícios observacionais e e indícios de fundo k, na medida em que (1)
P(e/h.k) (a
probabilidade posterior de
e) é alta; (2) P(h/k)
(a probabilidade prévia de h)
éalta; e (3) P(e/k) (a probabilidade prévia de e) é baixa. A primeira condição
é satisfeita na medida em que você esperar encontrar e se h for verdadeira (dado k).
A segunda condição é satisfeita na medida
em que h for
simples e que você espere que h
seja verdadeiro dados apenas os indícios de fundo. A terceira
condição é satisfeita na medida em
que P(e/k)
não é muito maior que [P(e/h.k)
x P(h/k)]; ou
seja, você não esperaria encontrar e a não ser que h fosse verdadeiro. É claro que, quando se
está avaliando a probabilidade de um teoria científica ou histórica, não se
podem dar valores numéricos exatos a todos esses termos – a não ser em caso de
valores extremos. Mas nós podemos dar valores aproximados a eles – digamos que
alguns termos tenham um valor alto ou baixo, ou que seja maior que esse termo
ou menor que aquele outro – e isso é freqüentemente o bastante para nos dar
algum resultado interessante.
Agora, admita-se que k seja o conjunto de
indícios da teologia natural, muitos dos quais considerei nas minhas duas
primeiras conferências. Admitase que e
seja o conjunto dos indícios históricos, consistindo de uma conjunção de três
indícios (e1
& e2 &
e3). Admita-se
que e1 e e2 sejam duas partes dos
indícios históricos prévios que é útil manter separados – e1 seriam os indícios
históricos prévios da vida de Jesus e e2
seria o indício de que nenhum outro profeta conhecido satisfez os requisitos
prévios ou os posteriores para ser um Deus Encarnado, se os compararmos com o
que nossos indícios (por exemplo, e1
e e2) sugerem
acerca de Jesus.
Admita-se que e3 seja um indício histórico posterior tal
como o relato de testemunhas da pós-crucifixão acerca da ressurreição.
Admita-se que h
seja a hipótese de que Jesus ressurgiu dos mortos. Nosso interesse está em P(h/e.k), a probabilidade
de que Jesus ressurgiu dos mortos (h),
dados os indícios tanto da teologia natural (k),
da história pormenorizada de Jesus e de outros profetas humanos (e).
O Teorema
de Bayes (Pastor presbiteriano e matemático, sua fórmula é usada em
várias aplicações atuai, como os filtros anti-spams, na internet, foto) nos
diz que isso é uma função de três elementos. Mas estes, por sua vez, de acordo
com o cálculo, são funções de outras probabilidades; e devemos abordar nosso
resultado gradualmente. À medida que seguimos, atribuiremos certos valores a
essas outras probabilidades – algumas das quais eu defendi hoje; outras para as
quais eu dei argumentos em conferências anteriores. Indicarei, então, que
aqueles valores tornam h
muito provável em vista de (e.k)
e que teríamos que atribuir alguns valores bem diferentes a algumas das
probabilidades para evitar aquela conclusão; deixo para vocês refletirem acerca
da plausibilidade disso.
Representemos por t o teísmo, a afirmação
de que um Deus do tipo tradicional existe. P(t/k)
é a probabilidade de que existe um tal Deus com base nos argumentos da teologia
natural. Em vista do tipo de argumentos que delineei nas minhas duas outras
conferências, atribuamos a isso o modesto valor de 0,5. Representemos então por
c a afirmação
de que Deus se tornaria (em algum tempo) encarnado, por duas ou três das razões
apresentadas antes, que requereriam um supermilagre ao final daquela vida para
autenticá-la como vida de Deus (c
representa “encarnação calcedônia”).
Atribuamos também o modesto valor de 0,5 à
P(c/t.k), a
probabilidade de que, se Deus existe, ele se encarnaria da maneira exposta. O
valor que você dá medirá o grau pelo qual você está impressionado por argumentos
acerca da probabilidade, ou mesmo necessidade, de uma encarnação. Lembre-se que
meus argumentos sugerem um valor muito mais alto. P(c/k) é a probabilidade dos argumentos da
teologia natural de que existe um Deus que encarna por aquelas razões. P(c/k) = P(c/ t.k) x P(t/k), considerando os
valores sugeridos, ou seja, 0,5 x 0,5 = 0,25.
Agora, inicialmente, ao invés de e1, e2 e e3, tomemos f1, f2 e f3. f1 é o indício de
que os requisitos prévios para ser Deus encarnado são satisfeitos em um profeta
qualquer (em um certo grau, mas não necessariamente no mesmo em que eles são
satisfeitos em Jesus). f3
é o indício de que requisitos posteriores para ser Deus encarnado (ou seja, sua
vida culminar com um supermilagre) são satisfeitas naquele mesmo profeta (no
grau em que são satisfeitos em Jesus).
f2 é o indício de que nem os requisitos prévios nem os posteriores
são satisfeitos naquele grau em qualquer outro profeta(3).
Ora, se c é verdadeiro, se uma encarnação
ocorre, quão provável é que haverá indícios f, a conjunção (f1 & f2 &
f3)? Argumentei que se esperaria que um Deus Encarnado que vivesse uma vida
santa ensinasse-nos verdades morais profundas, fundasse uma Igreja que
ensinasse a sua encarnação e expiação, bem como que ele mesmo ensinasse que sua
vida era uma expiação e que ele era divino. Sugeri que o tipo de indícios que
temos acerca da vida de Jesus é tal que a esperaríamos com base nos três
primeiros elementos, mas possivelmente não, com base nos dois últimos.
E, talvez, se a vida de Jesus fosse culminada
com um supermilagre como o da ressurreição, poder-se-ia esperar ainda mais
indícios de aparições e de uma tumba vazia do que se tem de fato. Assim, que
valor daríamos para P(f/
c.k)? Sejamos modestos e atribuamos 0,1. Assim, dados os argumentos
da teologia natural, a probabilidade de que existe um Deus que encarnou pelas
razões expostas e nos deixa com os indícios do tipo f, temos:
P(f.c/k) = P(f/c.k) x P(c/k) = 0,25 x 0,1 =
0,025
Agora, voltemos para P(f/k). Esta é igual {a
probabilidade, dado k,
de que existe um Deus que encarnou e deixou indícios do tipo f} mais {a
probabilidade, dado k,
de que ou não existe Deus ou que Ele não encarnou, mas que deixou indícios do
tipo f}:
P( f
/ k) = P( f /
c.k)P(c / k)
+ P( f / ~ c.k)P(~
c / k)
O primeiro termo composto do lado direito
da equação é aquele que nós acabamos de calcular e para o qual demos a
estimativa provisória de 0,025. E quanto ao segundo termo? P(~c/k) = 0,75, dado que
(como assumimos provisoriamente) P(c/k)
= 0,25 – uma vez que, por um axioma óbvio do cálculo, P(c/k) + P(~c/k) = 1. E quanto à P(f/~c.k)? Esta é a
probabilidade de que não há encarnação (ou porque Deus não existe ou porque Ele
não encarnou), no entanto, há indícios da teologia natural e f ainda assim ocorre. f, lembre-se, é o indício
total de que um profeta satisfez tanto os requisitos prévios quanto posteriores
para a encarnação, embora apenas um profeta na história humana tenha satisfeito
os requisitos prévios e um profeta tenha satisfeito os requisitos posteriores
naquele grau. A probabilidade de uma tal coincidência casual é enormemente
baixa, a menos que Deus tenha planejado isso.
Se Deus de fato planejou esta conexão,
então teria sido enganador da parte dele que aquele profeta não fosse Deus
Encarnado, pois – se assumimos um Deus com razão para se encarnar – a
ocorrência simultânea dos indícios prévios e posteriores seria tomada como
mostrando isso. Assim, digamos que a P(f/~c.k)
= 0,001. Assim, P(f/k)
= 0,025 + 0,75 x 0,001 = 0,02575
que é um número bem
próximo de 1. Isso representa a probabilidade do tipo de indícios que temos
acerca de Jesus de que Deus se encarnou ou se encarnará. No entanto, nossos
indícios agora são um pouquinho maiores do que f. É o indício e de que o
profeta ao qual f se refere é Jesus. Isso dificilmente faz alguma diferença
para a probabilidade de que f (dado k) nos dá c, se acrescentamos a f quem é o
profeta, uma vez que todos os fatos relevantes acerca de Jesus estão
incorporados em f, em todo caso. Assim,
P(c/e.k)
= P(c/f.k) =
0,97085
Ora, a probabilidade de c dado (e.k) será virtualmente a
mesma que a probabilidade de h
dado (e.k).
Pois se Deus se torna encarnado em um modo tal que sua vida precisa ser
culminada por um supermilagre, e há apenas um (dado e) sério candidato para tanto, há
Ressurreição, ou seja, deve ter havido uma ressurreição. Além disso, dado o
indício do tipo de vida que Jesus levou e que ninguém jamais tinha levado,
seria enganador por parte de Deus causar a ressurreição de Jesus, a não ser que
Jesus fosse Deus Encarnado. Assim, h
é verdadeiro se, e somente se, c
é verdadeiro.
Logo, por um outro óbvio axioma do cálculo,
P(h/c.k) = P(c/e.k) = 0,97085. Ou
seja, a probabilidade, dada a totalidade de nossos indícios, de que a
ressurreição ocorreu, é da ordem de 97%.Cheguei a esse valor alto, apesar de
atribuir o valor baixo de 0,1 à probabilidade de que, se Jesus era Deus
Encarnado, teríamos o tipo de indícios históricos pormenorizados acerca de sua
vida e da suposta ressurreição que de fato nós temos.
Para evitar minha conclusão, um opositor,
se deixar os outros valores probabilísticos intactos, terá que diminuir este
valor [o de que Jesus era Deus Encarnado](4)
para 0,003. Antes do valor posterior de h
e, portanto, de c,
ficar abaixo de 0,5. De outro modo, o opositor deverá descartar a teologia
natural muito mais do que eu. Se, por exemplo, ele pensar que a teologia
natural dá uma probabilidade de 0,0196 (1/51), ao invés de 0,5 (1/2) para a
existência de Deus, ou de que há apenas uma probabilidade de 0,0196 (1/51) de
que se Deus existe, Ele se encarnará, tem-se uma probabilidade em torno de 0,5
(1/2) de que Deus se encarnou em Cristo.
Ou, de modo implausível para mim, um
opositor poderia afirmar que não é de todo improvável (mesmo se Deus não fosse
responsável por isso) que poderíamos ter essa coincidência de indícios em um
mesmo profeta que satisfizesse os requisitos prévios e os requisitos posteriores,
embora para nenhum outro profeta houvesse aquela qualidade de indícios que ele
satisfez, segundo qualquer dos dois requisitos.
Mas, assim, o opositor precisaria aumentar
o valor de P(f/~c.k)
de 0,001 para acima de 0,033 (1/30) para ter a probabilidade posterior de h
caindo para abaixo de 0,5 (1/2).Sherlock Holmes fez a famosa observação de que:
“Quando você eliminou o impossível, o que quer que permaneça, não importa o quão improvável,
deve ser a verdade”(5).
Parafraseando (e ignorando o problema da
probabilidade prévia para termos uma bela máxima), temos: “Quando você eliminou
o que torna muito, muito improvável que teríamos os indícios que temos, o que
quer que permaneça, mesmo que isso torne muito improvável que encontrássemos os
indícios que encontramos, é provavelmente a verdade”.
Se você concorda comigo que a coincidência
dos indícios que temos da satisfação dos requisitos prévios e posteriores é
(salvo intervenção divina) muito, muito improvável, e que o indício de sua
coincidência (se Deus interveio para se encarnar e ressurgir dos mortos) é
apenas muito improvável, segue-se que é muito provável que Jesus ressurgiu dos
mortos, e, também, que ele era Deus Encarnado, então, obviamente, segue-se que
Deus existe.
Ora, repito, não apresentei para vocês os
indícios históricos pormenorizados de que, na minha visão, há uma probabilidade
de 0,1 de que Jesus fosse Deus Encarnado. E há muitos livros céticos
bem-instruídos acerca do que esses indícios mostram. Meu tópico nesta
conferência é que se você faz certas suposições modestas acerca da força da
teologia natural (pressupostos para os quais apresentei argumentos nas minhas
conferências anteriores), você terá de ser muito cético mesmo acerca do valor
dos indícios históricos pormenorizados para evitar a conclusão cristã e,
portanto, teísta.
Notas:
1. The Ressurection of God Incarnate,
Oxford:
Clarendon Press, 2003.
2. Para a minha
teodicéia, veja meu Providence
and the Problem of Evil (Oxford: Clarendon Press, 1998).
3. Os indícios
históricos podem ser descritos em termos gerais amplos ou termos bastante
precisos. Por frases usadas depois, como “o tipo e quantidade de indícios” e “o
grau e modo” pelos quais os requisitos são satisfeitos, tinha em mente uma
descrição de indícios elaborada de modo muito amplo – por exemplo, “Jesus disse
algumas palavras em ocasiões cruciais no sentido de que sua vida e morte
constituíam uma expiação e fez seus discípulos acreditar em nisso”, ao invés de
que ele disse e eles disseram exatamente as palavras que disseram.
Certamente,
em minha hipótese, aquela deverá ser muito mais provável que esta última. De
fato, é um teorema do cálculo de probabilidades no qual se uma proposição
(precisa) acarreta uma outra proposição (imprecisa), esta última é sempre ao
menos tão provável, e, normalmente, mais provável, do que a primeira, com base
nos mesmos indícios. Mas não interessa o quão exatamente nós construamos os
indícios.
Isso
porque, enquanto a probabilidade daquele indício preciso em vista da hipótese
de que Jesus era Deus que ressurgiu dos mortos será menor quanto mais preciso o
indício for construído, aquela probabilidade também será menor na mesma
proporção da negação daquela hipótese. As duas diminuições de probabilidade vão
anular uma à outra.
4. Interpolação
do tradutor.
5. A. Conan Doyle, The Sign of Four, in The Complete Sherlock Homes,
Vol. 1 (Doubleday, 1930, p. 111).
Por Richard Swinburn