O
salmo dois, exuberantemente messiânico e centrado no senhorio de Deus sobre
todas as coisas, principia revelando aquela que é a essência do pecado, a
rebelião do homem contra o criador; e a recusa do homem em se submeter ao
governo soberano de Deus. Nesse particular, antes de se consubstanciar em atos
deliberadamente atentatórios contra a lei de Deus, o pecado é um estado da
condição humana marcado por um ser/fazer, que se pretende emancipado de Deus e
indiferente ao santo e justo império da sua “boa, agradável e prefeita
vontade”.
A
história é antiga e deita raízes lá no Jardim no Éden, quando, em infeliz
consonância cm a serpente, Adão e Eva deram as costas a Deus e passaram a viver
de conformidade com a sua vontade caída e inteiramente corrompida. É ratificando
essa irreverente postura que se abre o salmo dois.
Os
reis da terra se levantam contra o Senhor; e os príncipes insubordinam-se
contra o ungido do Senhor, Jesus Cristo, e proclamam, em altaneiro som, que não
aceitam o senhorio do Filho de Deus; a sua regência; o seu comando sobre tudo e
todos. O gesto é acintoso e sumamente revelador de corações maus e ingratos
para com aquele que é a fonte suprema de todo o bem; e que nos criou para a
promoção do seu justo louvor e da sua merecida glória.
No
salmo em apreço, a impiedade humana é traduzida na força estilística dos verbos
utilizados: “rompamos e sacudamos”. Tem-se aqui, de modo ostensivo, uma espécie
de conspiração contra o Altíssimo. O uso da palavra “algemas” indicia a
pernóstica leitura que o homem pecador faz do Deus santo, que, por essa ótica
distorcida, passa a ser encarado como um ser mau, que escraviza o homem e o
impede de viver a sua vida de forma plena; assim agindo, o homem ignora, por
pura corrupção, que é somente em Deus que encontramos completa e suficiente
satisfação. Ademais, o caráter de Deus é posto em cheque, da mesma maneira que
a serpente fez no malévolo diálogo que travou com Adão e Eva no Éden.
A
resposta de Deus, que não tarde e não falha consorcia riso santo e furor
certeiro. O riso divino é sinalização cabal de que toda tentativa do homem de
viver à revelia de Deus é rematada loucura; trágica escolha, que receberá, no
seu devido tempo, o merecido juízo. Mesmo que os homens não gostem ou insistam
em ignorar, a ira de Deus é uma verdade recorrentemente ensinada nas Escrituras
Sagradas; e da qual somente poderemos escapar se estivermos abrigados em Jesus
Cristo, o nosso bendito Salvador. Salvador esse que é também Senhor, por Deus
constituído como Rei supremo, aquele cujo reinado jamais terá fim; e diante de
quem todas as pessoas, sem exceção e sem distinção, haverão de se curvar, e
confessar que ele é o Senhor.
Por
fim, o Deus misericordioso, que não leva em conta os tempos da ignorância
espiritual dos homens, conforme preconiza o apóstolo Paulo no solene sermão
proferido no Areópago de Atenas, apela aos homens que se arrependam; insta com
eles para que abandonem o pecado e “beijem o Filho”; refugiem-se na insecável
fonte da sua maravilhosa graça; da sua salvífica graça; da sua superabundante
graça, infinitamente maior do que o nosso indigno pecado.
Belíssimo
em toda a sua arquitetura composicional, o salmo dois começa com a rebelião dos
homens contra o seu criador, mas se conclui com a bendita promessa de salvação
que Deus faz e estende a todos os que, confrontados com a impactante mensagem
do evangelho, arrependem-se dos seus pecados e creem na pessoa e na obra
redentora do nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
SOLI
DEO GLORIA NUNC ET SEMPER.
José Mario Silva
José Mario Silva