Por Greg Koukl
Traduzido por Semi Chung Azeka – Artigo original aqui.
Provavelmente nenhum outro conceito tem tido mais peso em
nossa cultura do “politicamente correto” do que a noção de tolerância.
Infelizmente, uma das mais nobres virtudes da América tem sido tão distorcida
que se tornou um vício.
Existe um mito moderno que sustenta a ideia de que a
verdadeira tolerância consiste em neutralidade. É um pressuposto que tem se
arraigado numa sociedade enraizada no relativismo.
Uma pessoa tolerante ocupa um terreno neutro, um lugar de
completa imparcialidade na qual é permitido cada pessoa decidir por si só.
Nenhum julgamento é permitido. Nada de “forçar” pontos de vista pessoais. Cada
um toma uma postura neutra para as convicções de outro.
Esta abordagem é bem comum entre os pós-modernos, uma
geração de céticos radicais cujas ideias comandam o respeito injustificado nas
universidades hoje. Seu grito de guerra, “Não existe uma verdade”, é muitas
vezes acompanhado de um apelo à tolerância.
Para todos os seus tumultos, berros e violência, o apelo do
relativista afirma duas verdades, uma racional e uma moral: a primeira é a
“verdade” de que não há verdade, a segunda é a verdade moral de que se deve
tolerar o ponto de vista de outras pessoas. Sua postura, contraditória em pelo
menos dois pontos, serve como alerta de que a noção moderna de tolerância é
seriamente equivocada.
Três elementos da tolerância
Muitas pessoas estão confusas sobre o que vem a ser a
tolerância. De acordo com o dicionário Webster’s New World Dictionary,
Second College Edition, a palavra tolerar significa deixar ou permitir,
reconhecer e respeitar crenças e práticas de outros sem compartilhar delas,
suportar ou aguentar alguém ou algo que não necessariamente gostou.
Tolerância, portanto, envolve três elementos: (1) deixar ou
permitir (2) uma conduta ou ponto de vista de alguém que não concordamos (3)
enquanto respeitamos a pessoa durante o processo.
Notem que não podemos tolerar alguém a menos que
discordemos dele. Isso é crítico. Nós não “toleramos” pessoas que compartilham
dos mesmos pontos de vista dos nossos. Eles estão no nosso lado. Não há nada a
se fazer a respeito. Tolerância é reservada para aqueles que pensamos estarem
errados.
Esse elemento essencial da tolerância – desacordo – foi
completamente perdido na distorção moderna do conceito. Hoje em dia, se você
pensa que algo está errado, você é chamado de intolerante.
Isso apresenta um problema curioso. Uma pessoa precisa,
primeiramente, pensar que outro está errado para poder praticar a tolerância
com ele, ainda assim, ao fazê-lo, acusam-no de intolerância. É um “catch-22”.
De acordo com essa abordagem, a verdadeira tolerância é impossível.
Três faces da tolerância
Somando a essa confusão, é o fato de que a tolerância pode
ser aplicada a diferentes coisas – pessoas, condutas, ideias – e as regras são
diferentes para cada uma delas.
Tolerância às pessoas, o que poderíamos chamar de
“civilidade”, pode ser equiparado com a palavra “respeito”. Esta é a definição
clássica de tolerância: a liberdade de expressar as ideias sem medo de
represálias.
Respeitamos aqueles que sustentam crenças diferentes das
nossas tratando-os com cortesia, dando um espaço aos seus pontos de vista no
debate público. Nós até podemos discordar fortemente e contestar vigorosamente
contra eles no debate público, mas ainda assim mostrar respeito pelas pessoas,
apesar das diferenças.
Note que o respeito é concedido à pessoa. Se seu
comportamento deve ser tolerado é uma questão completamente diferente. Este é o
segundo sentido da tolerância, a liberdade de agir, chamada tolerância ao
comportamento. Nossas leis mostram que um homem pode acreditar no que gosta – e
ele geralmente tem a liberdade de expressar essas crenças – mas pode ser que
não seja permitido agir de certas maneiras que ele gostaria. Algumas condutas
são imorais ou ameaçam o bem comum. Em vez de ser tolerado, ele é restringido
pela lei. Nas palavras de Lincoln: “Não há o direito de fazer o mal”.
Tolerância à pessoa precisa ser distinguida da tolerância
às ideias. A tolerância às pessoas exige que as opiniões de cada pessoa recebam
uma audiência cortês, e não que todas as visões tenham o mesmo valor, mérito ou
veracidade. A visão de que as ideias de ninguém são melhores ou mais
verdadeiras do que as de outro é irracional e absurda. Argumentar que alguns
pontos de vistas são falsos, imorais ou simplesmente tolos, não viola nenhum
padrão significativo de tolerância.
Essas três categorias são freqüentemente misturadas por
mentes confusas. Se alguém rejeita as ideias ou comportamentos de outro, ele é
automaticamente acusado de estar rejeitando e desrespeitando a pessoa. Falar
que sou intolerante à pessoa porque discordo com suas ideias é confuso. Nesta
visão de tolerância, nenhuma ideia ou comportamento pode sofrer oposição,
independente de quão graciosamente seja feita, sem convidar a acusação de
incivilidade.
Historicamente, nossa cultura tem enfatizado a tolerância
às todas as pessoas, mas nunca tolerância à todos os comportamentos. Esta é uma
distinção crítica porque, na retórica atual do relativismo, o conceito de
tolerância é freqüentemente usado em defesa para comportamentos como: sexo
antes do casamento, o aborto, a homossexualidade, o uso de pornografia, etc. As
pessoas devem ser capazes de se comportar da maneira que desejam num amplo
quadro de limites morais, os argumentos continuam.
Ironicamente, porém, há pouca tolerância para a expressão
de ideias contrárias sobre questões de moralidade e religião. Se alguém
defende uma visão diferente, ele é violentamente censurado. A questão da
tolerância tem, portanto, sido muito contraditória e incoerente: tolerar a
maioria dos comportamentos, mas não tolerar crenças opostas sobre esses
comportamentos. Opiniões morais contrárias são rotuladas como “impor sua visão
sobre outros”.
Ao invés de ouvir, “Eu respeito seu ponto de vista,”
aqueles que se diferenciam por serem “politicamente incorretos” são chamados de
intolerantes, retrógrados e opressores.
Um caso pontual foi um ataque feito ao meu jornal
comunitário sobre os cristãos que estavam desconfortáveis com a pressão social
para aprovar a homossexualidade. Escrevi a seguinte carta ao editor para
mostrar como a noção moderna de tolerância foi distorcida em um vício em vez de
uma virtude:
Caro Editor:
Estou grandemente surpreso em ver como residentes de South
Bay são intolerantes em relação à moralidade dos outros, mas não com a sua. O
último artigo da semana passada sobre homossexualidade foi exemplo disso. Um
escritor até sugeriu que a censura alternasse opiniões.
Essa atitude de pequenez mental e auto-justificada sobre
ética sexual é hipócrita. Eles desafiam o que eles enxergam como ódio
(costumava-se a chamar de moralidade) com ataques ácidos e vitrílicos. Eles
condenam a censura pedindo por censura (há uma diferença). Eles acusam outros
de intolerância e fanatismo e em seguida repreendem essas mesmas pessoas por
terem uma visão contrária a sua.
Por que alguém é atacado de forma tão violenta simplesmente
por afirmar orientações morais sobre sexo que nos mantiveram em bom lugar por milhares
de anos?
Não somente isso, as objeções são autodestrutivas. Os
escritores implicam que todos deveriam ter o direto de fazer e acreditar no que
quiserem e que não se deve permitir alguém forçar seu ponto de vista sobre
outros. Mas esse é o ponto de vista deles, que eles imediatamente tentam forçar
em seus leitores de forma abusiva.
Aqueles com crenças opostas foram rotulados na imprensa
como fanáticos, covardes, desrespeitosos, desprovidos de coragem, abomináveis,
temíveis, indecentes, ligados ao KKK, e – você pode acreditar – intolerante.
Por que não abandonamos todo esse absurdo sobre tolerância
e abertura de mente?É enganoso porque cada um tem seu ponto de vista que pensa
estar correto. O real problema é sobre qual tipo de moralidade nossa sociedade
deve encorajar e se essa moralidade é baseada em fatos e raciocínio sadio ou
retórica vazia.
Covardia Intelectual
A maior parte do que se passa por sendo tolerância hoje,
não é de maneira alguma tolerância, mas sim desonestidade intelectual. Aqueles
que se escondem atrás do mito da neutralidade geralmente estão com medo de se
engajar intelectualmente (inteligentemente). Não querendo ser desafiado por
pontos de vista diferentes, eles não se envolvem em opiniões contrárias ou nem
ao menos as consideram. É mais fácil atirar um insulto – “seu fanático
intolerante”- do que confrontar a ideia e refutá-la ou ser mudada por ela.
“Tolerância” tornou-se intolerância.
A regra clássica da tolerância é essa: Tolerar as pessoas
em todas as circunstâncias, dando-lhes respeito e cortesia mesmo quando suas
ideias são falsas ou estúpidas. Tolerar (isto é, permitir) um comportamento que
seja moral e consistente com o bem comum. Finalmente, tolerar (ou seja, abraçar
e acreditar) ideias que são sólidas. Esta é ainda uma boa orientação.