A EXPIAÇÃO NO CALVÁRIO

 

 Através dos benefícios outorgados à criação humana pelo sacrifício vicário de Cristo torna-se incontestável a salvação diretiva de Deus, contudo, por quem Jesus realmente morreu é o debate recorrente na história da teologia da igreja e consequentemente nos grupos evangélicos existentes, desde os ensinamentos totalmente contraditórios às Escrituras, como é o caso do Universalismo e do Pelagianismo, até outros aceitos nas comunidades cristãs e que produzem um teor voltado para os ensinamentos bíblicos, mas, mesmo assim, divergem em alguns aspectos. Dentre esses aspectos divergentes vários teólogos do passado e da contemporaneidade aprofundaram seus estudos tentando ora minimizar essas brechas, ora defender seu ponto de vista, ambos sob uma perspectiva puramente respaldada pelas Escrituras, ou seja, uns grupos apontam para uma expiação limitada – é o caso de presbiterianos, batistas, congregacionais, etc., que trazem à luz uma cristologia com base no Calvinismo – e outros veem na expiação ilimitada como o melhor caminho – são eles na maioria os grupos pentecostais (Assembleia de Deus, Quadrangular, Nazareno, Metodista, etc.) que se apoiam no modelo Arminiano para defesa de sua crença.
  Destarte ficar evidente que Jesus Cristo é o centro de discussão da maioria em potencial desses grupos e que a teologia é riquíssima em cooperar para o bom estudo da Bíblia Sagrada desde os primórdios quando atuavam os pais da igreja e já se tentava formular pontos de vista em relação à expiação atravessando o tempo e chegando à pós-modernidade com um leque de muito mais adeptos em ambos os lados. Esse trabalho presta-se ao enriquecimento do assunto e visa somar ao bom andamento das doutrinas cristãs.

Expiação Limitada

            Segundo os particularistas, assim também chamados aos adeptos da teoria da expiação limitada, argumentam que Cristo morreu somente por um grupo de pessoas eleitas durante todas as dispensações predeterminadas por Deus.

Expiação Ilimitada

            Conforme os defensores do universalismo qualificado ou teoria da expiação ilimitada creem que Cristo morreu por todos os homens que no presente arrependem-se e creem no Senhor, tempo este que separa as duas vindas de Cristo, mas, com propósitos diferenciados em relação aos salvos do passado e consequentemente os do futuro.

Então, por quem Cristo morreu?

            A questão em debate deve ser entendida, a começar, evitando a dogmatização extremada feita pelos grupos divergentes, pois, cada um dos lados possuem suas bases na Bíblia e na lógica, onde a questão não é de aplicação: Ambos admitem que nem todos serão salvos. A discórdia vem da vontade divina em tornar a salvação possível a todos ou somente um grupo de eleitos. O foco está na amplitude da expiação. Stanley Horton (1997) apud Thiessen concluem o pensamento do Sínodo de Dort (1618-19): “[...] que a expiação é ilimitada no sentido de estar à disposição de todos; é limitada no sentido de ser eficaz somente para aqueles que creem. Está à disposição de todos, mas é eficiente apenas para os eleitos”. A resposta, contudo, não seria tão simples assim. Muita pesquisa e leitura são feitas por teólogos comprometidos com a verdade das Escrituras e em ambos os pontos de vista ainda há profundidade absoluta no assunto para se extrair muito mais. Desta forma, esta pesquisa, dentro do estudo da Cristologia – uma das áreas da Teologia Sistemática – tenta absorver as ideias centrais de teólogos que concentram opiniões nos dois pontos: Expiação limitada e ilimitada como se segue nas laudas abaixo.
Stanley M. Horton, teólogo Pentecostal norte-americano, escritor e educador (1916-2014) apresenta em sua Teologia Sistemática uma breve alusão ao assunto em destaque, mas deixa claro sua defesa em prol da expiação ilimitada, pois, afirma que somente o universalismo qualificado dá sentido à oferta sincera do Evangelho a todo o indivíduo e que antes da ascensão do Calvinismo, a expiação ilimitada havia sido a opinião majoritária desde os primórdios da Igreja; cita ainda que a ideia da expiação ilimitada atrai um segmento muito maior do testemunho bíblico com menos distorção do que a expiação limitada.
É preferível entre os Reformados a expressão Redenção Particular ao invés de Expiação Limitada, pois esta última estaria dizendo que a obra expiatória de Jesus fosse deficiente em algum aspecto. Wayne Grudem (2010) em sua Teologia Sistemática esclarece algumas questões em relação a essa doutrina e o faz com cautela quando são apresentadas as implicações pastorais desse ensino, ou seja, tais reformados devem reconhecer o potencial de equívocos que podem suscitar a expressão ‘Cristo morreu só por seu povo’ (uma frase ambígua) ao público incrédulo, por amor à verdade e à preocupação pastoral em oferecer gratuitamente o evangelho.
Já sob a perspectiva do teólogo sistemático Lewis Sperry Chafer (2003), com uma das maiores complexidades pela erudição do seu trabalho, argumenta que para se entender as controvérsias entre os teólogos ortodoxos e eruditos em relação ao assunto deve-se antecipadamente analisar a ordem dos decretos Divinos, onde cinco deles estão diretamente relacionados com o propósito da eleição. Uma ordem lógica, antes que cronológica – partindo do princípio de causa e efeito na mente de Deus, onde uma questão prepara o caminho para outra e assim por diante. Estes decretos são listados abaixo, agora sem importar a ordem divina correta, mas somente para reconhecimento:

1 – O decreto de eleger alguns para a salvação e deixar outro entregues à justa condenação deles;
2 – O decreto de criar todos os homens;
3 – O decreto de permitir a queda;
4 – O decreto de providenciar salvação para os homens;
5 – O decreto de aplicar a salvação aos homens.
            Chafer mostra que quatro escolas de interpretação são reconhecidas, cada uma defendendo uma ordem específica na ordenação destes decretos eletivos, ou seja, calvinistas supralapsarianos (1, 2, 3, 4 e 5), calvinistas infralapsarianos (2, 3, 4, 4 e 1), calvinistas sublapsarianos (2, 3, 1, 4 e 5) e arminianos (2, 3, 1, 4 e 5 – a ordem aqui é idêntica à visão infralapsariana, exceto a visão arminiana da eleição). A partir do momento que são movidas em ordens diferenciadas esses cinco pontos, obviamente os resultados serão diferentes. “As escolas calvinistas são o resultado de uma indução fiel da Palavra de Deus relacionada com os decretos eletivos, enquanto que a escola arminiana é uma intrusão da razão humana” (CHAFER, 2003, vol. 3 e 4, p. 181).
            Contudo, o próprio Chafer levanta um questionamento: “Como pode um evangelho universal ser pregado, se não há uma provisão universal?” (CHAFER, 2003, vol. 3 e 4, p. 181), ou seja, isso implica dizer que Cristo não morreu para os não eleitos, mas sua expiação vicária é a base onde a salvação é oferecida a todo o mundo; perigosamente uma contradição.
            Aparentemente, Louis Berkrof (2009) produz um texto mostrando o propósito da expiação destinado a afetar a relação de Deus com o pecador, ou seja, a expiação não só tornou possível a salvação para o ser humano, como também a garantiu, contudo, o mesmo não foge a regra: Qual a extensão dessa expiação? Ele argumenta que o ponto exato da expiação está centralizado na seguinte afirmativa: “A Bíblia ensina claramente que a finalidade e o efeito da obra expiatória de Cristo não consistem apenas em tornar possível a salvação, mas, sim, em reconciliar Deus com o homem e dar aos homens efetiva posse da salvação eterna, uma salvação que muitos não conseguem obter” (BERKHOF, 2009, p. 364).

Quadro Explicativo da Relação entre Expiação Limitada e Ilimitada

            A síntese desta pesquisa pode ser suficientemente resumida no quadro abaixo que trás uma visão abrangente do que esses quatro teólogos sistemáticos (Horton, Chafer, Berkof e Grudem) apontaram em sua produção literária tendo como centro Cristo e o tipo de expiação por eles defendida. Levando em conta a definição de Expiação como sendo o “[...] aspecto da obra de Cristo, e particularmente sua morte, que torna possível a restauração da comunhão entre indivíduos que creem em Deus” (ERICKSON, 2011, p. 77), a palavra expiação só é encontrada no Antigo Testamento – kãphar – usado aproximadamente setenta vezes, cujo significado é cobrir, ou seja, Deus perdoava e restaurava o indivíduo onde o pecado era somente coberto pelo sacrifício de animais, isto de forma típica e não real. No Novo Testamento a palavra expiação não é realmente encontrada. A palavra que trás o significado mais próximo dessa verdade é reconciliação e seu significado é trazer duas pessoas, antes separadas, para um estado de concordância (CHAFER, 2003).


Expiação
Ilimitada
Limitada
Pelagianismo
Universalismo
Por quem Jesus morreu?
Por todos os seres humanos que atestam uma fé em Cristo no presente.
Somente pelos que Deus elegeu desde a fundação dos tempos.
Somente como exemplo para os pecadores.
Por todos os seres humanos, pelos anjos decaídos, e em todas as eras.
Aplicação da Expiação
Deus resgatará a tantos quantos crerem em seu Filho Jesus.
É extremamente rigoroso o desígnio de Deus em favor somente dos seus eleitos.
Qualquer ser humano, desde que tenha uma vida piedosa como Cristo, poderá adquirir sua expiação; heresia do Pelagianismo.
Deus em seu infinito amor sobrepujará toda forma de pecado, o que é tido como heresia pelos teólogos ortodoxos.
Como é visto o pecado
Nascemos pecadores e culpados pelos nossos pecados herdados da queda de Adão.
Nascemos pecadores e culpados em Adão.
Nascemos sem pecado como Adão, mas pecamos no decorrer da vida, ou seja, negam o pecado original.
Somos pecadores, porém culpados somente pelos nossos erros e não pelos de Adão.
Pontos fortes dessa doutrina
Os que defendem a expiação ilimitada reconhecem aspectos dispensacionalistas dos tratamentos divinos com os homens onde o aspecto universal da morte de Cristo é aplicado somente à Igreja na era presente.
A eleição incondicional afirma que Deus elege pessoas para a salvação baseado inteiramente em Sua vontade, e não em nada que seja inerente à pessoa, bem como sua graça irresistível onde Deus chama alguém para a salvação, e esta pessoa inevitavelmente virá a ser salva.
Ao criar o homem Deus não o submete, como as outras criaturas, com a lei da natureza, mas deu-lhe o privilégio único de realizar a vontade divina por sua própria escolha. Esta possibilidade de escolher livremente o bem implica a possibilidade de escolher o mal em uma responsabilidade moral.
Deus não pode agir independentemente do amor e que Deus tem sempre o propósito de expressar Seu amor em tudo o que faz.
Pontos fracos desta doutrina
A depravação parcial defende que cada aspecto da humanidade está contaminado pelo pecado, mas não ao ponto de fazer que os homens sejam incapazes de colocar sua fé em Deus por iniciativa própria; surge a graça resistível.
Ignoram as distinções das dispensações reconhecendo um propósito eletivo de Deus incluindo toda raça humana em sucessão contínua.
Não reconhecem que só com a ajuda da graça divina pode um indivíduo superar a força do pecado e viver corretamente diante de Deus.
Todos os seres humanos e angelicais criados por Deus, sem exceção, serão salvos e irão para o céu. Não existe nenhum inferno eterno.
Justificativas Bíblicas
Hb. 2.9; 
Jo. 3.16; 
Jo. 1. 29;
I Tm. 2.4;
I Jo. 2.2.
Jo. 10.11,15;
Ef. 5.25-27;
At. 20.28;
Mt. 1.21;
Rm. 8.32-35;
Jo. 6. 37-39.
I Jo. 4. 8, 13.
At. 3.21.